O que pode nos levar até lá? “Lá” é onde o desejo, o sonho, já foi realizado. O conceito de sobrevivência é amplo e deve ser compreendido dessa forma. Nada é simples, tudo é muito mais complexo do que parece; não estrague tudo simplificando as coisas. Sobreviver não é apenas o que parece.
Os questionamentos sobre potenciais grandes atletas que se perderam no caminho antes de conquistar alguma coisa, tudo por conta de algumas opções a mais que tinham na vida, possuem muitos adeptos. Opções significam que haverá menos dedicação em um único caminho. O trabalho mental e físico será distribuído entre as opções. Jogar e estudar filosofia, por exemplo, não é algo que contribui para a carreira de um atleta. Mas o assunto é a comida, na verdade é sobre como fazer a comida ir para mesa. Caso o atleta tenha outra possibilidade para ganhar dinheiro e isso ocupe, de certa forma, o seu imaginário, a tendência é que ele não consiga crescer ou não consiga atingir os níveis mais altos desse esporte. O futebol exige tudo de quem o pratica.
Pode-se perceber que a preparação de um atleta tem se tornado cada vez mais complexa. Com o jogo cada vez mais técnico e científico e uma série de avaliações fisiológicas que fornecem dados quase exatos sobre a capacidade desses profissionais, o preparo mental tornou-se a pedra angular do sucesso das grandes equipes. Um time só vence quando rompe a barreira psicológica da derrota. E para isso, é preciso ter mais do que jogadores, é preciso ter homens no time. Claro que vale o mesmo para as modalidades femininas, e nesses casos, podemos dizer que é preciso ser maduro o suficiente para compreender o mundo para além do físico.
A dureza que o atleta precisa adquirir passa por uma série de questionamentos de caráter emocional. Que atitude tomar em momentos de dor e confusão? Como permanecer lutando mesmo quando a derrota parece estar muito próxima? As respostas para esses questionamentos moldam atletas vencedores e pessoas maduras.
Mesmo assim, a tendência é observarmos que a pobreza gera atletas mais bem finalizados e atribui-se a isso o fato de que eles lutam pelo prato de comida. Eles lutam pela sobrevivência. Mas isso implica em problemas que surgem logo em seguida. A carreira começa e a comida vai para a mesa, e sem precisar lutar pela comida, eles já não lutam mais por muita coisa.
É uma conta que não fecha, pois a luta por dinheiro gera dinheiro, e o estabelecimento dele gera acomodação, que por sua vez gera fracasso e queda.
Os grandes atletas não jogam mais por dinheiro, mas continuam lutando pela sobrevivência das próprias ideias. Um atleta bem formado é uma ideia, é um símbolo de superação. Um atleta é muito mais do que um profissional à disposição de um clube. Ele é a mensagem que o clube está transmitindo naquele momento. Sempre será pela sobrevivência, mas é preciso compreender, antes de tudo, que as aspirações mais profundas de uma pessoa precisam ser ouvidas e trabalhadas para tornarem-se concretas. A luta é mais profunda em cada ser humano. Cada jogador manda uma mensagem diferente. A luta é pela sobrevivência da mensagem.
“A gente não quer só comida”, nem todo mundo sabe disso. No primeiro momento, parece que a gente só quer um pouco de bebida, diversão e arte. Mas a gente não quer só isso, a gente quer viver representando alguma coisa especial. Encontrar esse caminho é mais difícil do que conquistar a comida e encontrá-lo também é uma questão de sobrevivência.