Tivemos a oportunidade de conversar com um jovem atleta que atualmente defende a camisa do CSA (@csaoficial – https://www.instagram.com/csaoficial/ ) e que, por acaso ou não, possui ideias alinhadas com a filosofia divulgada aqui na Mentalidade de Atleta.
Gabriel Dirceu (@dirceu.oficial – https://www.instagram.com/dirceu.oficial/ ) é um exemplo, não apenas como um atleta, profissional e trabalhador, mas também como um jovem que, mesmo nesse momento de tanta desconcentração e falta de autoconhecimento, que batalha diariamente para desenvolver o melhor de si e conquistar seus objetivos mais elevados.
Esperamos que esta breve entrevista possa contribuir, mesmo que de forma singela, para a vida das pessoas.
Boa leitura.

Mentalidade de Atleta – Entrevista com Gabriel Dirceu
Mentalidade de Atleta: Como foi o início da sua carreira e quais foram seus primeiros pensamentos sobre se tornar um profissional do futebol?
Gabriel Dirceu: Foi igual ao de toda criança. Sempre gostei de brincar de futebol, com amigos, com meu pai, e conforme o tempo foi passando, fui gostando ainda mais. Mas, aos sete anos de idade, minha mãe me colocou em uma escolinha de futsal. Eu era bem abaixo na habilidade com a bola, mas ao longo dos anos, passei a ser um dos destaques da escolinha. Evolui e melhorei bastante. Com 12 anos, fui para o futsal da Portuguesa do Rio de Janeiro. Lá, eu já estava bem acima dos outros, era um destaque também e, um ano depois, fui chamado para fazer um teste na base da Portuguesa no futebol de campo, para o sub-14. Fiz o teste, passei e tudo mudou.
Mentalidade de Atleta: Você percebeu alguma cobrança diferente quando ingressou nas categorias de base?
Gabriel Dirceu: Totalmente diferente. No sub-14 da Portuguesa, eu percebi a realidade do futebol. Eu estava abaixo fisicamente, tecnicamente e mentalmente. Eu estava acostumado com o ambiente de escolinha, onde sempre fui destaque e recebia elogios, essa transição para o ambiente mais sério e profissional do futebol de base foi drástica. Na base todos já possuem uma noção clara dos objetivos e do que o futebol exige do atleta profissional.
Mentalidade de Atleta: Teve que mudar alguns pontos?
Gabriel Dirceu: Tive que mudar totalmente a minha forma de pensar e de jogar. Foi só na Portuguesa que surgiu o pensamento de ser um jogador profissional de verdade. Percebi que, se realmente quisesse ser profissional, teria que dar tudo de mim, mais de 100%, todos os dias, e que só assim os resultados viriam. Daquele jeito, imaginando que treinava muito apenas por treinar o que me pediam no clube e fazia academia, eu não iria chegar a lugar algum.
Mentalidade de Atleta: Você passou por alguma situação que pareceu ser negativa mas que no fim das contas se mostrou algo importante para sua carreira?
Gabriel Dirceu: Logo que mudei da escolinha para a base, me deparei com a realidade do futebol, e foi um choque. A brincadeira saiu de cena e tudo passou a ser sobre desempenho e vitórias. Na alta performance, ou se adapta ou fica no meio do caminho. Foi um ano muito ruim para mim. Eu era excluído e participei de pouquíssimos jogos, e realmente estava muito abaixo dos outros atletas.

“No início do sub-15, o treinador me chamou e disse que, se não me adaptasse e não começasse a competir de verdade, seria mandado embora do time. Nesse momento, senti que a ficha caiu. Voltei para casa chorando, como já tinha acontecido várias vezes, mas naquele dia foi diferente. Compreendi que estava abaixo dos outros e que precisava treinar mais. “
Isso um ano depois de entrar na base. Foi uma das piores coisas que ouvi, mas ao mesmo tempo foi fundamental na minha vida. Mudei tanto a ponto de me tornar completamente obcecado pelo futebol e por melhorar a cada dia. Meus treinos evoluíram de uma vez por dia no clube e na academia para 7 horas diárias, trabalhando técnica, regeneração, alongamentos, e estudando a mentalidade de outros atletas, de outros esportes, que alcançaram os mais altos níveis do esporte. Um dos piores momentos da minha vida se transformou em uma das melhores coisas que já me aconteceram. Consigo até enxergar que, se tivesse chegado à base com o mesmo clima da escolinha, sendo bem visto e sendo o destaque da equipe, teria ficado no meio do caminho.
Mentalidade de Atleta: Você acredita que os atletas com talento precisam passar por um tipo de provação mental para seguir em frente?
Gabriel Dirceu: Muita gente acha estranho quando eu falo isso, mas enxergo o talento como uma espécie de maldição. Porque é difícil para uma pessoa talentosa se dar bem na alta performance. Por incrível que pareça, as pessoas que observam de fora acham que o talento é uma benção. Mas o que mais se vê, na verdade, são pessoas talentosas que ficam pelo meio do caminho, porque acreditaram tanto no talento que deixaram de treinar, ou não treinaram o suficiente, não se alimentaram o suficiente, não dormiram bem, não se dedicaram o suficiente. Ficaram pelo meio do caminho, culpando algumas pessoas pelos seus resultados.
Mentalidade de Atleta: Talvez o talento com a bola leve o atleta a imaginar que conseguirá alcançar o sucesso sem trabalho duro.
Gabriel Dirceu: Certamente. Vejo pessoas que não possuem nem 50% de talento se dando bem no futebol, nos estudos ou em qualquer área. As pessoas me chamavam de talentoso antes de eu entrar para a base, mas quando cheguei lá, eu vi que não era. Graças a Deus acordei desse conforto e passei a compreender o valor do trabalho duro. Para evoluir em qualquer coisa, percebi que precisaria me esforçar além da conta. A crítica que sofri na base, uma palavra direta que doeu muito na hora, foi uma das melhores coisas que aconteceu na minha vida.

Mentalidade de Atleta: Como você enxerga a importância da força mental para um atleta?
Gabriel Dirceu: Muita gente me faz essa pergunta. Ao longo desse caminho, já me deparei com frustrações, vitórias e derrotas, e buscando informações sobre grandes atletas para compreender como esses caras pensam a alta performance, já está muito claro para mim que, se alguma coisa pode mudar os resultados de uma trajetória, é o trabalho na mentalidade. É o que controla tudo, é o que manda em tudo. A forma como você pensa é o que dita a forma como você age. E para trabalhar duro, é preciso que a mente esteja voltada para isso. E quando digo trabalho duro, não quero dizer o que a maioria das pessoas falam, sobre foco, disciplina, treinar, se alimentar e fazer o certo. Isso todo mundo já sabe e é o básico para um atleta. Para chegar no topo, no mais alto possível do que você pode chegar, você precisa se tornar obcecado pelo que faz. É sobre você entregar tudo, se dedicar 100% de toda a sua alma naquilo. É tudo sobre conquistar o que você quer, e o que não estiver de acordo com isso, você tira da sua vida. É sobre esse nível exagerado de vontade, sobre fome, sobre estar completamente faminto pelos seus resultados. Com fome, como se só essa fome importasse. Quando você chegar nesse ponto, consegue ver seus objetivos de forma mais clara.
Mentalidade de Atleta: Você possui alguma crença religiosa?
Gabriel Dirceu: Sim, sou cristão católico e atribuo tudo a Deus. Mas não acredito que Ele nos dê as coisas de mão beijada só porque queremos ou porque somos boas pessoas. Creio que Ele nos pede para trabalhar duro em nossa vida. Ele nos dá algumas condições para realizar as coisas, e uma delas é a energia e convicção para seguir trabalhando duro. Na minha vida, tenho certeza, é Ele que me dá essa energia que coloco todos os dias na minha rotina. Acredito que atletas de ponta como Kobe Bryant, Michael Phelps, Tiger Woods, recebem lá de cima essa energia para seguir sempre trabalhando duro.
Mentalidade de Atleta: Você já teve alguma lesão grave? Como você se sentiu em relação à sua carreira e ao seu desenvolvimento nesse momento?
Gabriel Dirceu: Já me lesionei, algumas sérias, outras não. Graças a Deus, neste ano (2023), não tive nada sério. Tive duas lesões sérias que doeram muito. É muito ruim sentir a dor e ficar sem jogar, mas elas representaram a minha entrega. Quando percebi que tinha dado tudo o que podia, cheguei no limite. Essas lesões foram importantíssimas para eu chegar onde queria. Foi uma das melhores sensações da minha vida. Uma delas foi uma fratura no tornozelo direito e uma lesão do ligamento de segundo grau. Na hora foi ruim, mas o sentimento, por incrível que pareça, de dever cumprido naquela lesão foi gigantesco. Sabia que tinha dado 100% de mim, que não tinha mais o que fazer, e que os resultados estavam chegando. Foi o sentimento de dever cumprido. Também foi um aprendizado para cuidar mais do meu corpo. Um ano depois, desenvolvi uma lesão crônica no quadril esquerdo. Estava treinando todos os dias a perna esquerda. Não conseguia melhorar a perna esquerda até o dia em que cheguei a treinar cerca de 200 chutes por dia. Pegava a bola, cortava para o meio e chutava com a esquerda. Todos os dias repetindo o mesmo movimento, várias e várias vezes por dia, até que meu quadril começou a desenvolver uma lesão crônica. Doía muito. Sabia que tinha sido por isso. Mas no final do ano, fiz meu primeiro gol de perna esquerda, quando jogava pelo Volta Redonda. Meu quadril ainda doía muito, mas esse ano (2021), fui um dos destaques do futebol carioca e um dos 10 destaques do futebol brasileiro na lateral direita. Senti que tudo valeu a pena e que era só cuidar ainda mais do meu corpo.
“Foi ruim, foi dolorido, mas sentir que entreguei o meu máximo para atingir meus objetivos não tem preço nem descrição. Foi demais.“
Mentalidade de Atleta: E a sua rotina de preparação e treinos?
Gabriel Dirceu: Já faz uns 3 ou 4 anos que mantenho a mesma rotina de treinos, mais ou menos 7 horas por dia e 2 horas no domingo. Domingo são treinos regenerativos e uma hora de treinamento técnico. De segunda a sábado, acordo entre 5 e 7 horas da manhã, vou para o clube, depois para a academia, em seguida para o campo, e depois faço algum treino regenerativo, fisioterapia, piscina ou alongamento. Essa parte eu repito todo santo dia. Até brinco que para mim, todo dia é segunda-feira. Nada muda.

Mentalidade de Atleta: Como você enxerga a função da sua posição para o time dentro do jogo?
Gabriel Dirceu: A função do lateral direito dentro do jogo eu enxergo como uma válvula de escape. Aquele lateral mais ofensivo, mais aberto, é como uma válvula de escape. O meio está congestionado, não tem como sair, daí você faz a abertura lá para o lateral. O lateral é diferente das outras posições, ele não vai ficar na ponta, ele vai surgir na ponta. Uma coisa é você marcar um jogador que você sabe que estará lá com você na ponta. Outra coisa é você marcar um jogador, no caso o lateral, que não vai estar lá, ele vai para lá. Ele não vai estar lá esperando a bola, ele vai atacar o espaço para encontrar a bola. Eu acho que o lateral é uma válvula de escape. Ele precisa fazer os três setores do campo.
Mentalidade de Atleta: Alguma característica emocional que a posição exige?
Gabriel Dirceu: Concentração. Isso tenho certeza absoluta, principalmente para o lateral direito. Porque ele ocupa as três posições do campo. Ele joga no ataque, fica no meio, trabalha na construção de jogadas e precisa defender. Enquanto defende, precisa estar atento para não quebrar a linha de defesa e para não levar uma bola nas costas pelo fundo, ou uma bola entre linhas, que é entre zagueiro e lateral. Também tem que prestar atenção quando a equipe recupera a bola, pois precisa dar abertura lá na ponta direita para inverter o jogo. É uma posição que exige muita concentração.
Mentalidade de Atleta: E o capitão da equipe, como você percebe a importância desse profissional?
Gabriel Dirceu: A importância é gigantesca. Todos precisam agir mais ou menos como um capitão, mas ele é o principal. Não tem nada a ver com mandar nos outros, mas em ser o exemplo para o time. Ele é o líder. A maior liderança é pelo exemplo. O primeiro a chegar, o último a sair, mostrando vontade, disciplina, mostrando a garra de ganhar em todos os jogos e também sendo uma conexão entre o treinador e os jogadores. Ele precisa falar com o treinador e com os jogadores. O capitão que é um exemplo e consegue transmitir a sua filosofia para o time eleva o nível da equipe em 500%. Os jogadores enxergam no capitão o exemplo e se espelham nele.
Mentalidade de Atleta: E falando em treinadores, o que você considera fundamental para um bom treinador?
Gabriel Dirceu: Principalmente, a capacidade de gerir o grupo e evitar que brigas e intrigas aconteçam. A vaidade também é um problema que o técnico precisa conter, além de instilar no grupo uma cultura de trabalho duro. Isso é o mais importante. Quando ele consegue estabelecer uma cultura de trabalho duro no grupo, todos são motivados a elevar o nível do time, tanto na parte física, técnica quanto mental. Um bom controle e uma boa gestão do grupo, embora nem todos do grupo sejam amigos, certamente é uma das grandes características de um bom treinador. De qualquer forma, o mais importante é o treinador ter uma cultura de trabalho duro e implementar uma boa gestão de grupo.
Mentalidade de Atleta: E você percebe alguma influência da cultura do clube na sua forma de jogar e treinar?
Gabriel Dirceu: Claro, muita. Por exemplo, o Corinthians prefere jogadores com raça, aguerridos. Já no Santos, o jogador que vai crescer lá tende a ser aquele jogador magrinho, habilidoso e muito técnico. Isso não significa que a torcida do Corinthians não vá gostar de jogadores técnicos e que a do Santos não vá gostar de jogadores aguerridos. Cada clube tem seu estilo. É muito importante, antes de aceitar alguma proposta para um novo clube, saber sobre essas características, conhecer um pouco da história dos jogadores que já passaram por lá, e o perfil que a torcida gosta. Isso ajuda, principalmente, a cair nas graças da torcida.
Mentalidade de Atleta: E como você se sente quando é colocado no banco de reservas depois de ser titular?
Gabriel Dirceu: É um sentimento horrível, de não se sentir bom o suficiente, de ter raiva do treinador, de não saber o motivo porque isso aconteceu, de saber que você pode estar em um lugar mas não está por algum motivo. É horrível. E se você ficar por muito tempo no banco ou sem ser relacionado, você acaba tendo dúvidas sobre se você é bom mesmo.
Quando isso aconteceu comigo, eu fiquei com muita raiva do treinador, mas eu aprendi a não expressar isso e a compreender que existe um motivo por trás disso tudo. Chamar o treinador para conversar e buscar melhorar é a melhor saída. O segredo é buscar melhorar em todos os pontos até ser insubstituível. Procurar mostrar para os torcedores e profissionais, que eu não deveria estar no banco. Trabalhar para causar algum constrangimento para o treinador. A torcida precisa enxergar que tal jogador não deveria estar no banco. É uma forma de se manter focado e buscando melhorar.
Mentalidade de Atleta: E como você encara a troca de treinador? As coisas mudam muito quando isso acontece?
Gabriel Dirceu: Depende do momento do clube, até porque geralmente essa troca ocorre quando o time não está bem, não está alcançando os resultados esperados. Então, essa troca geralmente é boa, pois o treinador vem motivado, querendo fazer um bom trabalho, e os jogadores também se motivam. Quem está jogando não quer perder a vaga, e os que estão no banco querem ser vistos com outros olhos. Então, todo mundo se motiva. Pelo menos por um tempo, todo mundo fica mais motivado.
Mentalidade de Atleta: E você teve que mudar a sua forma de jogar por conta do treinador?
Gabriel Dirceu: Claro. Alguns deles me ajudaram muito na parte tática, pois apresentaram formas de jogar que eu não conhecia. Como lateral direito, principalmente, mas no jogo em si. Nesses momentos, o treinador nos exige um jeito de jogar que ainda não estamos habituados, e vamos criando um certo repertório. Com o tempo, aprendendo com vários técnicos e jogadores diferentes, fui me tornando mais completo, com várias formas de jogar, jogadas diferentes para fazer, tomadas de decisão e pensamentos dentro de campo.
Mentalidade de Atleta: E as críticas da imprensa e das redes sociais? Como você lida com isso?
Gabriel Dirceu: Eu ainda não tenho esse pessoal que não gosta de mim abertamente. Estou evoluindo agora, ganhando mais seguidores e sendo mais conhecido, por enquanto não tenho haters, mas sei que isso vai acontecer em seguida.
Mentalidade de Atleta: E as redes sociais, atrapalham?
Gabriel Dirceu: Depende muito do atleta. Ficar de bobeira nas redes sociais, procrastinando o que deveria ser feito, não tenho dúvidas de que é ruim. Já percebi, também, que alguns atletas acabam vendo algum outro jogador que subiu, que melhorou, que subiu de nível e acaba se desmotivando, achando que não pode chegar, ao invés de se motivar. Mas, principalmente no pré-jogo, sei que já existe um estudo sobre isso, ver o celular antes de entrar em campo, antes de fazer um treino, diminui a força, a capacidade física e a qualidade na tomada de decisão. Mas, claro, ajuda para se espelhar em atletas maiores e melhores. A gente pode ver o que eles fazem para evoluir. Eu me motivo muito quando vejo um grande atleta treinando pesado. Mas, é aquela coisa, você precisa saber utilizar as redes sociais a seu favor.
Mentalidade de Atleta: E a preparação física, técnica e emocional?
Gabriel Dirceu: Eu acho que toda a preparação ajuda a evoluir, seja no campo, na areia, na academia, no estúdio, na quadra, na piscina, na fisioterapia, na massagem, no regenerativo, lendo livros, estudando como pensavam jogadores de alta performance, assistindo jogos, melhores momentos, vendo melhores momentos de atletas. É um conjunto complexo, com vários tijolos diferentes, que formam toda a obra no final das contas.
Mentalidade de Atleta: Você se prepara para ingressar em ligas estrangeiras? Como?
Gabriel Dirceu: Me preparo, mas do mesmo jeito que eu me preparo para ser destaque aqui no Brasil, para estar no topo, para o time ser campeão, para ser o melhor. É tijolo por tijolo e só assim você constrói um grande edifício. Eu não me preparo para as ligas em que vou jogar, mas sim, para ser o melhor que posso ser. Independentemente de estar na série D do Brasil ou nas melhores ligas da Europa, quero ser o melhor que posso ser. Onde estiver, vou querer ser o destaque. Hoje estou no CSA e me preparo para ser o melhor aqui.
Mentalidade de Atleta: E na base, teve algum tipo de trabalho de cunho emocional e psicológico?
Gabriel Dirceu: Não. Incrível isso, né. Nunca teve, em nenhum clube que eu passei. Alguns clubes até tinham psicólogos, mas só para quando você estava com algum problema. Nunca houve um trabalho emocional, de mentalidade, de forma contínua, dia após dia. Isso seria muito importante e parece ser o que falta no Brasil, pelo menos com os atletas que eu joguei e nos clubes que eu passei. Não existe um trabalho nessa parte emocional. E o pior é que eu vejo muitos jogadores bons ficarem no meio do caminho por conta disso. Eu comecei a fazer esse trabalho de forma individual, com coachs, neurocientistas, psicólogos, estudando e lendo. Tudo isso, claro, além das obrigações que tenho com o clube.
Mentalidade de Atleta: E como você lida com as derrotas? Procura ajuda para lidar com esse momento?
Gabriel Dirceu: Eu trabalho com um neurocientista todos os dias, e ele me ajuda no desenvolvimento emocional. É uma mistura de psicólogo com coaching, e nas derrotas ele também me auxilia. É uma base científica que utilizo todos os dias, não só nas derrotas ou vitórias, mas antes e depois dos treinos e dos jogos. As derrotas não costumam me abalar. Hoje em dia eu encaro a derrota como um aprendizado que faz a roda girar e me ajuda a evoluir. Claro que algumas pressões internas, e algumas derrotas são fortes, mas eu procuro sempre esse auxílio emocional.
Mentalidade de Atleta: Você já percebeu em alguma equipe que você jogou algum problema emocional e fracassou por isso? Quais problemas?
Gabriel Dirceu: Sim, eu já percebi sim, muitas vezes. Eu atribuo tudo à parte mental. Se a equipe fracassou, provavelmente foi na parte mental. Por não ter esse trabalho efetivo nas equipes, isso ainda está muito perdido. Muitas vezes foi por falta de vontade, por soberba do time ou de alguns jogadores e pela equipe não compreender o que significa trabalho duro. Isso atrapalha demais, quando os atletas não compreendem o que significa trabalhar duro.
Às vezes o jogador não tem inteligência emocional para saber se controlar em algumas horas, ou falta de confiança. Muitos dizem, ah, foi a parte física. Mas a parte física também está atrelada à parte emocional. Porque se o cara não tem o foco para treinar todo dia seja na academia, no campo, treinar mais velocidade, resistência, força ou potência, ele não vai estar bem fisicamente, ou se ele não toma as melhores decisões dentro de campo, parece ser uma parte tática, mas na verdade é que ele não está muito confiante dentro do campo.
Mentalidade de Atleta: Você acredita que as categorias de base no Brasil fazem um bom trabalho? O que você mudaria?
Gabriel Dirceu: Eu acredito que sim, mas dava para ser melhor. Pela base pensar muito como profissional sobre resultados, acredito que muitos atletas no meio caminho, o que não explora o total potencial de muitos atletas. Mas, é como funciona. Tudo é movido por resultados. Mas se eu tivesse alguma coisa para mudar eu focaria mais em desenvolvimento e padrão de algumas coisas, do que em resultados.
Mentalidade de Atleta: Como você enxerga a atividade da imprensa esportiva no Brasil?
Gabriel Dirceu: Para te falar a verdade, muitas vezes não dá nem para ver. Porque é um julgamento em cima dos jogadores, e isso me faz muito mal. Julgando jogadores, falando mal deles, humilhando, tratando eles como se eles fossem vagabundos. Ninguém está ali de sacanagem. Ninguém erra de sacanagem, ninguém se machuca de sacanagem, ninguém está ali de brincadeira ou porque é divertido. Na maioria das vezes eles nem acham mais o futebol divertido. Essa é a verdade. Eles estão ali para fazer o trabalho deles, para ganhar o dinheiro deles. Até porque, se eles não jogarem bem eles vão chegar em outro clube ganhando menos, até chegar uma hora que eles vão decair. Ninguém está ali de sacanagem e eu vejo que a imprensa, muitas vezes, explora as questões do futebol de forma equivocada e desrespeitosa.
Mentalidade de Atleta: Que tipo de orientação faz mais falta para os atletas?
Gabriel Dirceu: Certamente é a parte mental. Isso aí você pode ver facilmente convivendo com jogadores, e conversando com pessoas próximas que atribuem a falta de vontade, disciplina, de cabeça ou confiança. Até o que você vê na TV, jogadores que ainda não estão prontos mentalmente. O que mais falta é a parte mental, é o que mais falam. Muitos amigos meus, que eram melhores do que eu e que ficaram no meio do caminho, por algum motivo que eu não faço ideia, os caras não tinham nenhum preparo emocional. Eram subdesenvolvidos na parte mental e emocional.
Gabriel, estamos torcendo e desejando o maior sucesso do mundo para você. Que a sua mentalidade, dedicação e sabedoria seja difundida entre os jovens do Brasil.
