Como a maioria das coisas neste mundo, falar é fácil e agir, além de ser difícil, dói. Isso pode levar muitas pessoas a pensarem que as teorias não servem para nada; o que realmente vale é o que é colocado em prática. De fato, porém, tudo indica que toda prática é fruto de uma teoria. A verdade é que, na maioria das vezes, não temos consciência de onde surgiram nossas ideias praticadas, mas a fonte de inspiração está ali, submersa, guiando nossas atitudes, desde as mais básicas até as mais complexas.
Afinal, não é necessário explicar cada detalhe e a origem das coisas que fazemos, sob pena de um burnout. No entanto, o resultado de nossa vida é fruto das ideias que colocamos em prática e das milhares que nos surgem em sonhos e inspirações. Poucas delas sobrevivem à primeira negociação: elas cobram dores e ninguém gosta de sentir dor. Dessa forma, a maioria dos planos e ideias vai para os porões, uma tentativa de esquecê-las, onde elas permanecem por tempo suficiente para acumular poeira sem jamais serem descartadas. Realizar dói.
Encontrar uma maneira de lidar com o sofrimento que as realizações nos cobram exige uma grande dose de imaginação, uma imaginação que não apenas nos permite enxergar e planejar um sonho, mas também senti-lo realizado.
Dentro do esporte de alto rendimento, é fácil perceber a necessidade de gerenciar o sofrimento. Para percorrer 10 mil quilômetros correndo, muita dor precisa ser gerenciada, muitas negociações emocionais são feitas para levar alguém à vitória neste desafio. O corpo precisa adquirir a capacidade de percorrer aquela distância, e a mente precisa adquirir a capacidade de negociar com a dor. O sofrimento faz parte dos treinos de alta performance, mas também faz parte da vida de qualquer pessoa que deseje alcançar um lugar melhor para si.
A ex-corredora britânica Paula Radcliffe, que foi recordista mundial da maratona feminina, praticava um tipo de treinamento com muitas repetições, mas também com muitos intervalos para manter a intensidade sempre no topo e, além disso, treinar o foco na atividade. Isso se assemelha à técnica pomodoro para aqueles que trabalham em uma mesa.
(25 minutos de concentração total + 5 de descanso = 1 pomodoro, 4 pomodoros = 1 ciclo de trabalho de alta performance mental)
As atividades de alto desempenho exigem dos praticantes treinamentos em várias esferas diferentes. Para quem os observa apenas em seus momentos de glória ou fracasso durante as competições, pode parecer que apenas a parte física está em ação. É evidente que ter um corpo saudável e adequado para as atividades é fundamental, mas o desempenho técnico e mental é o que separa os meros praticantes dos campeões.
O desenvolvimento técnico exige minúcias e atenção constante aos detalhes. A mente observa como o corpo se movimenta e o corrige. A função do treinador, do coach, do conselheiro ou mentor é fundamental para aprimorar esses detalhes. Quando nos dedicamos profundamente a uma atividade, muitas vezes nos concentramos apenas nos esforços que estamos fazendo, deixando de lado os pequenos ajustes. Esse é um trabalho interminável que pode nos frustrar e nos afastar de projetos, planos ou ideias que estamos colocando em prática.
Nossa mentalidade não nasceu pronta para enfrentar a dor. Nossa cultura atualmente nos ensina a dar mais importância à dor, fadiga e cansaço do que ao pódio de nossas ideias. De certa forma, tudo ao nosso redor tem nos mimado. Pessoas mimadas não querem enfrentar a dor, e assim, milhares de sonhos acabam no porão, empoeirados, mas nunca esquecidos.
Na ilusão de se livrar das frustrações, gastam-se horas em vídeos infinitos e insignificantes dentro de redes sociais, como um SOMA (Admirável Mundo Novo) que resolve os sentimentos ruins que brotam quando não se faz o que deveria ser feito. Dessa forma, evitando o negócio da dor, as coisas não deixam o campo das ideias, não são colocadas em prática, e as vitórias pessoais não acontecem. Nossa cultura tem atrapalhado as pequenas conquistas que deveriam ser o centro de tudo. Negociar com a dor faz parte de qualquer realização pessoal e coletiva.
