O futebol é mais complexo do que parece. Uma manifestação cultural de magnitudes globais que vai muito além de uma modalidade esportiva, mais do que uma expressão de emoções incontroláveis, muito mais complexo do que um conjunto de estratégias de marketing em busca de entretenimento para a população. O futebol não seria o que é caso o cerne do ser humano não fosse tocado. Isso é válido para qualquer forma de comunicação e se aplica a qualquer manifestação que a massa adote. O futebol é um fenômeno de massa. Ele representa uma espécie de poder sutil (soft power) que penetra em todos os aspectos culturais.
De maneira geral, as modalidades esportivas sempre serviram para manifestar algum tipo de poder. Elas divulgam uma localidade ou promovem certas culturas como sendo mais fortes do que outras, sem a necessidade de travar uma guerra. Aqui está um ponto central: a guerra. Para muitos, especialmente para o senso comum, que se deixa levar pelas primeiras emoções, a guerra é considerada inútil e lamentável. Devido às terríveis consequências da guerra, é natural tentar erradicá-la das relações humanas. No entanto, como ainda não compreendemos completamente as raízes da guerra, ela continua a existir em todas as camadas da sociedade. A guerra está presente em todos os lugares, desde os menores níveis de emprego até os escalões mais altos. A guerra está na política e nas filosofias. A guerra está no jornalismo e nas palavras. A guerra está dentro de nós quando lutamos contra maus hábitos em favor dos bons. E a guerra começa, precisamente, na definição do que é bom e mau.
E nesse sentido, quando a conclusão se torna mais clara e um objetivo é estabelecido na vida de qualquer pessoa, a guerra começa a adquirir lados. Parece que nossa única opção é escolher um lado. Não podemos evitar a guerra; apenas podemos escolher um lado nela. Alguns exemplos históricos indicam que a tentativa de evitar a guerra, buscando simplesmente desmilitarizar o ambiente, pacificar as coisas, seja material ou culturalmente, pode resultar em mais guerras. Segundo Winston Churchill, Hitler só conseguiu se erguer contra o mundo devido a uma sensação envergonhada de desmilitarização, enfraquecendo o ímpeto dos países que deveriam manter a paz naquele momento.
A opinião pública, a do senso comum, é sensível às palavras e acaba sendo influenciada por explicações que apelam ao espírito combativo. No entanto, essa sensibilidade se mostra insensata devido a um detalhe crucial: a realidade.
A ideia de combater ou não, não parece ser uma opção. Caso fosse, poderíamos remover os conflitos de nosso convívio, quando a maioria das pessoas optasse pelo caminho da paz ao invés de ingressar em um conflito. O mundo seria perfeito e harmonioso.
Como estamos no Ocidente, nosso campo de visão é limitado ao que percebemos aqui. Nesse lado da história, existe um modelo considerado como causador de guerras: o homem combativo que, devido ao seu temperamento rudimentar, age de forma belicosa e agressiva desde a infância. Assim, de forma resumida, o resultado óbvio é que precisamos modificar o comportamento desse ser humano combativo de maneira geral e torná-lo mais pacífico. Dessa forma eliminaríamos as guerras.
Mas, não é possível considerar homens e mulheres como habitantes de mundos separados. A realidade é uma só. De alguma forma, tudo o que prejudica o homem também prejudicará a mulher. Homens que não são combativos deixam de se proteger, deixam de se importar com a honra, deixam de ser homens e deixam de ser justos. As mulheres colhem esses frutos, estragados, também.
O homem sempre exerceu o papel de protetor, mas o que tem sido considerado é que essa proteção só é necessária devido a outros homens protetores e agressivos. Isso cria um paradoxo, colocando os homens em uma guerra para se defenderem de si mesmos, e essa dinâmica seria a causa dos grandes conflitos. Assim, torna-se até lógico que eliminar o comportamento masculino poderia eliminar as guerras e os assassinatos e salvar milhões de pessoas.
No entanto, há outro lado da história: o homem injusto, que sempre existirá e sempre precisará ser combatido. Como dizem, “o mal prevalece quando os homens de bem não agem”. Sem a ação dos homens de combate justo, não haverá mais conflitos, pois a tirania, um elemento frequentemente negligenciado nessa equação, prevalecerá.
A guerra sempre estará à espreita, mesmo que ninguém realmente a deseje. A tirania sempre encontrará lugar em alguns corações, e será necessário entrar em conflitos para preservar nossa liberdade. O caminho da guerra não é um equívoco; ele é a única saída para a justiça. Mas, acima de tudo, existe a primeira batalha que cada indivíduo deve enfrentar: uma batalha eterna e constante para conquistar virtudes supremas, habilidades próprias e inclinações para a justiça. Fora isso, tudo é poeira e vaidade.
Enquanto se degrada os aspectos culturais masculinos, o futebol continua a crescer. É um esporte diretamente relacionado à capacidade física de atacar e competir contra o adversário. É uma simulação atraente de guerra e conflito, na qual a preparação e a filosofia desempenham papéis cruciais. Pode-se até imaginar que, em um conflito global, alguns treinadores de futebol se sairiam muito bem como generais.
O apelo ao público, a preparação dos atletas, a construção de uma nação e as vitórias necessárias para manter a equipe e os torcedores motivados, com combates regionais e até globais como na Copa do Mundo, simulam toda a estrutura de uma guerra.
Negar o conflito é o mesmo que permitir que o destino nos guie, à medida que perdemos o território de nossa liberdade. Aceitar a guerra e santificar nossos objetivos parece ser a única saída para nossa existência, ainda inexplicável, aqui na Terra.