O Mentalidade de Atleta teve a oportunidade de conversar com Leandro Borges, ex-atacante do Internacional de Porto Alegre que jogou em diversos clubes e teve uma boa experiência na Europa, no final dos anos 90.
Leandro Borges é mais um daqueles casos que podemos utilizar para valorizar o futebol e as pessoas que trabalham com esse esporte.
Para ingressar nessa carreira, os atletas precisam sacrificar muitos desejos, conter muitos impulsos e amadurecer rapidamente. Sim, um jogador precisa amadurecer mais rápido do que a maioria das pessoas. Independente dos problemas que podem ser destacados, talvez uma consequência do poder financeiro e fama, diga-se de passagem, algo que pouquíssimos atletas alcançam, a carreira de um jogador oferece um tipo de condição para o desenvolvimento pessoal que se tornou raro em nossa sociedade atual.
Um atleta não pode sucumbir frente aos problemas, ele precisa superá-los. Desde muito jovem, eles convivem com a possibilidade de lesões, de serem cortados do time, serem mandados embora, serem substituídos, e todos esses elementos são evitados por pessoas comuns.
Não é por acaso que temos uma grande satisfação, honra e respeito quando entrevistamos atletas, sejam eles da base ou ainda atuantes, sejam eles ex-atletas.
É uma carreira que promete muitas coisas, mas a certeza é apenas uma: sacrifícios diários.
Boa leitura a todos e obrigado pela atenção.

Mentalidade: Leandro, você já teve a oportunidade de jogar em vários clubes, incluindo alguns europeus, e no Internacional de Porto Alegre. Mas como começou esse processo para se tornar um profissional do futebol?
Leandro Borges: Eu comecei a jogar futebol por amor ao esporte. Não tinha nenhuma pretensão de me tornar profissional. Era uma época diferente; a gente não tinha acesso às tecnologias que nós temos hoje. Então, tudo girava em torno de jogar futebol. Eu dormia com uma bola e vivia com ela embaixo do braço. Isso foi tomando conta da minha vida até que fui levado para jogar na escolinha do Internacional. Em seguida, lá pelos 12 ou 13 anos, eu fui para as categorias de base e daí a coisa começou a ficar séria e eu passei a querer me tornar um jogador profissional.
Mentalidade: E as dificuldades, apareceu muita coisa para te atrapalhar?
Leandro Borges: Várias. O jogador de futebol é uma carreira que a maioria das pessoas só enxerga os vencedores, aqueles que conseguem uma carreira de sucesso, internacional e de idolatria. Mas a realidade do futebol é muito mais dura do que parece; a rotina, lesões, problemas familiares, o cansaço, as questões psicológicas, além de que às vezes você precisa optar por trabalhar e ajudar em casa ou jogar futebol. Mas essas coisas vão fortalecendo a mentalidade de alguma forma, vão te encorajando e te dando a força para você seguir em frente.
Mentalidade: Essas dificuldades, no fim das contas, são parte do processo de crescimento do profissional.
Leandro Borges: Sim. Você começa a se concentrar mais e a acreditar em você. Quanto mais desafios são superados, mais você acredita em você. Daí começa a ter mais fé e esperança no esporte e vai abandonando as dúvidas, enquanto ganha força, principalmente mental, para passar por cima das dificuldades que surgem.
Mentalidade: A pressão faz parte da rotina do jogador.
Leandro Borges: A rotina de um jogador é uma pressão emocional. As dificuldades e as questões emocionais no esporte são constantes. Diariamente o atleta é exposto a uma situação que cobra um preparo mental. Quando você decide se tornar um jogador profissional, você será testado emocionalmente todos os dias. A concorrência é muito grande; todos os dias alguém está tentando pegar o seu lugar. Isso faz com que você sinta a pressão do alto desempenho. Além disso, quando você joga em um grande clube existe a exigência das vitórias. E isso é desde muito jovem. Você precisa vencer, sempre. Outra coisa que pesa muito é a pressão da renovação de contrato. Você vai ficar no clube? Vai para um menor, um maior… A pressão no futebol é o todo o tempo. Até mesmo nas vitórias, se tem muito pouco tempo para aproveitar, pois no outro dia já tem que estar trabalhando novamente com a mesma pressão de sempre.
Mentalidade: E como foi a preparação na base?
Leandro Borges: É fundamental estar com os profissionais adequados que saibam tirar o melhor de você. Eu tive a oportunidade de trabalhar com grandes profissionais, como o professor Dorinho, o melhor treinador que eu tive, Abílio dos Reis, professor Escurinho, ex-jogador do Internacional. Além deles, na Suíça tive a oportunidade de trabalhar com Tigana, o lendário meio-campista francês, que inclusive treinou a seleção francesa. O principal é você ter a oportunidade de trabalhar com os melhores, pois eles irão tirar o melhor de você. Você tem que ter essa sorte de trabalhar com os melhores para você se tornar um bom profissional.
Mentalidade: E como você sente a influência da família na vida do atleta?
Leandro Borges: A família serve como alicerce, a base de tudo, mas muitas vezes a família pode atrapalhar. Em momentos que o atleta precisa de apoio à família pressiona. E para os jovens atletas existe outro detalhe. Os familiares podem acreditar que têm uma joia em casa e depositam as esperanças de uma salvação familiar nesse atleta, que ainda é uma criança. Mas, é claro que o apoio familiar é fundamental. A base familiar é a base de tudo. É quem vai dar o alicerce e o apoio para que você continue a se preparar. Porque no futebol, o resultado não vem de forma imediata. Você precisa “galgar” muito, se colocar à prova, se recuperar de lesões, e a família pode ser fundamental nessas horas para que o atleta não desista. Até porque, a vontade de desistir bate na porta todos os dias, e a de continuar, raramente.

Mentalidade: E os empresários, como você enxerga o papel desses profissionais?
Leandro Borges: Os empresários no futebol são uma realidade e você não consegue se desenvolver no futebol se não tiver um bom empresário. Não há dúvida de que eles ajudam muito. O atleta muito jovem, lá pelos 12 ou 13 anos, é um investimento que tem como objetivo obter lucro no futuro. Então, eles protegem bem os atletas, dando suporte, alimentação, educação, roupas, ajudam a família. Muitas vezes tiram a família de uma situação difícil. Começam a dar uma vida mais digna para a família do atleta e para o atleta, logo cedo. Esse é o lado positivo dos empresários na vida de um atleta. Mas, por outro lado, eles acabam “mimando” demais o jogador. E os jogadores não conseguem se desenvolver como pessoa, como homem, e muitas vezes esses jogadores se tornam dependentes para tudo, até para uma entrevista e não desenvolvem uma postura para se impor em situações difíceis.
Mentalidade: E a preparação para lidar com a imprensa?
Leandro Borges: Na verdade, os atletas são muito pouco preparados para lidar com a vida em si, principalmente com a imprensa. Os empresários, o clube e a família acabam afastando o atleta da imprensa por proteção. Eles protegem tanto os jogadores colocando-os em uma redoma tão grande que eles acabam perdendo até a capacidade de se expressar. Além disso, muitas vezes os empresários e até o clube não querem expor o seu “produto” a uma crítica ou uma polêmica que possa desvalorizá-lo ou criar problemas para o futuro do atleta.
Mentalidade: E como foram as lesões em sua carreira?
Leandro Borges: Sempre tive muita sorte com isso, nunca tive uma lesão séria, o que me ajudou bastante. Só no final da carreira, quando já estava com o pensamento de encerrar, tive uma lesão no braço. Mas já estava pensando em não jogar mais. Mas, graças a Deus, nos clubes por onde passei nunca me lesionei de forma séria. As lesões não chegaram a me atrapalhar.
Mentalidade: E como era a sua preparação antes dos jogos?
Leandro Borges: Eu me preparava bastante. Procurava ficar quietinho, colocava um fone de ouvido, fechava os olhos e ficava concentrado. Gostava de dormir bem, dormir até um pouco mais tarde. Tem jogador que gosta de acordar mais cedo e tomar um café da manhã. Eu já gostava de ficar na cama até mais tarde e de ficar pensando no jogo.

Mentalidade: E como era a rotina de treinos e recuperação?
Leandro Borges: O atleta vive sob restrição. Se um atleta pretende viver do esporte e ama o esporte que pratica, ele irá enfrentar uma série de restrições. Então, você tem uma rotina de treinos diária, trabalha muito e precisa colocar o seu corpo para descansar. Boas noites de sono, cuidar da alimentação e saber que não pode ter o mesmo tipo de vida que pessoas que não são atletas têm. Não pode tomar álcool, muito doce, ou ir a festas até tarde… É uma vida de restrições. Acordar, treinar, voltar para casa, descansar, jantar e dormir cedo. Claro que eventualmente você pode sair e se divertir, mas é uma vida de restrição.
Mentalidade: E as tuas qualidades como atleta?
Leandro Borges: Eu tive a oportunidade de jogar em um grande clube. Comecei muito cedo e conheci alguns países do mundo através do futebol. Acredito que realizei um bom trabalho. Minhas qualidades sempre foram o comprometimento; sempre gostei muito do que fazia e fui leal. O que considero determinante para ser um bom profissional é o comprometimento. Você precisa acreditar naquilo que está fazendo e estar comprometido. Quando descobre o que realmente quer fazer, precisa abrir mão de muitas coisas para seguir seu objetivo. Estar comprometido, acreditar no que faz e não baixar a cabeça diante das dificuldades que certamente irão surgir são características fundamentais para um profissional do futebol. No esporte é assim. Tem que estar sempre disposto a trabalhar. Se quer viver disso, não pode desistir nunca.
Mentalidade: E como você enxerga a sua posição?
Leandro Borges: Para um atacante, é fundamental ter muita concentração, pois ali você tem o poder de decidir um jogo em uma fração de segundos. É fundamental treinar muito, praticar finalizações, dominar os fundamentos exigidos pela função. Um bom atacante precisa saber finalizar, dominar os fundamentos, cabecear, finalizar com as duas pernas, ter bom domínio de bola, giro de corpo rápido e bom posicionamento. Tudo isso se adquire nos treinamentos. Treina-se muito para chegar ao jogo e colocar em prática tudo que foi treinado.
Mentalidade: E a função do capitão da equipe?
Leandro Borges: O capitão, geralmente, é escolhido de duas maneiras. Uma é observando aquele atleta que tem poder de persuasão sobre os demais, que é respeitado pelos jogadores, além de ser titular absoluto. A outra maneira ocorre quando não há essa figura unânime dentro do grupo e titular, observa-se o líder técnico, um jogador de destaque, o melhor jogador da equipe, o mais técnico. Aquele que chama a atenção. São várias lideranças dentro de um elenco: a liderança natural de quem tem o respeito dos atletas e a liderança técnica. Ambos são importantíssimos. São atletas que precisam dar o exemplo para manter o respeito do grupo. O capitão é a voz do treinador dentro de campo. Pode acontecer do capitão tomar uma decisão que passe, inclusive, por cima do que o treinador está dizendo. A presença do capitão é fundamental para o desempenho da equipe.
Mentalidade: O que você considera fundamental para um bom treinador?
Leandro Borges: Além do conhecimento tático sobre futebol, acredito que um bom treinador é aquele que sabe gerir um grupo. Ele precisa manter o olhar atento para todos os profissionais do elenco, desde o artilheiro do time até aquele que não está jogando no momento. Tem que saber tirar os jogadores da rotina, dar bons treinamentos, saber interagir. O técnico tem uma participação muito grande na questão emocional dos atletas. Ele precisa sentir como está o atleta e o grupo no dia a dia, saber o que está acontecendo. Além disso, ele precisa montar uma equipe de acordo com as características que aqueles jogadores possuem. Não adianta ter um sistema tático na cabeça e não ter os jogadores para executar o plano. O bom treinador trabalha com o material humano que tem em mãos.
Mentalidade: Qual é a influência da cultura do clube na sua forma de trabalhar, jogar e perceber o jogo?
Leandro Borges: Isso é muito interessante, porque cada clube tem uma história. E muitas vezes, contrata-se ou dispensa-se jogadores de acordo com a cultura de jogo da instituição. Às vezes, o jogador não é ruim, mas suas características não são adequadas para jogar naquele clube devido à cultura da instituição. Alguns jogadores servem para um clube e não servem para outro. O Santos, por exemplo, é um clube no Brasil que exige a presença de jogadores jovens, que venham da base. O Corinthians já exige jogadores mais aguerridos, que deem carrinho, não leva tanto em consideração o refinamento técnico, gostam mais da força. O Internacional, é a mesma coisa, gosta de jogadores comprometidos, com garra, que marquem pressão. Já no Rio de Janeiro, eles gostam de jogadores mais cadenciados, com mais toque de bola. Cada clube tem suas exigências, isso é comum e deve ser muito analisado tanto na contratação de um atleta quanto do ponto de vista do atleta quando tem a oportunidade de ser transferido.
Mentalidade: E como é ir para o banco de reservas? Como o jogador lida com isso?
Leandro Borges: Todo jogador quer jogar, e muitas vezes ele pode até procurar outro clube por conta do banco. Ele quer jogar. Quando um jogador é retirado da equipe, mesmo que ele esteja em uma fase terrível, ele acha que está sendo injustiçado. É bem difícil. Um atleta que vem jogando como titular e perde a posição, isso mexe com ele. Mexe com o emocional, e tem que estar preparado emocionalmente para digerir essa situação. Mas se o profissional estiver bem de cabeça, com bons amigos, com uma base familiar sólida e um bom acompanhamento, inclusive de empresários, ele consegue superar e dar a volta por cima. Mas sair da equipe não é fácil.
Mentalidade: E quando um jogador é contratado para a sua posição?
Leandro Borges: É muito relativo. Depende muito do seu momento dentro do clube. Se a gente está em um grande momento, em um momento especial no clube, a contratação de um novo jogador pode não significar muita coisa. Pode ser um jogador para te substituir quando você não estiver apto para jogar, ou pode ser para concorrer com a sua vaga. Mas isso é comum no futebol. Desde muito cedo se convive com isso. Todos os dias tentam trazer um jogador para sua posição, seja qual for a posição que você exerça. Ainda mais em clubes grandes. Isso não afeta tanto, pois faz parte do futebol e vai depender da sua condição do clube no momento.
Mentalidade: Como você se sente quando ouve críticas da imprensa ou em redes sociais?
Leandro Borges: Quando o jogador tem uma cabeça boa e não é mimado, ele sabe que não vai agradar a todos. Claro, tem as críticas construtivas que são muito importantes, mas as negativas entram por um ouvido e saem pelo outro. Hoje em dia, o futebol é o esporte mais praticado do mundo, e como diz o ditado, “de médico, louco e treinador de futebol, todo mundo tem um pouco.” Todo mundo acha que sabe sobre futebol e tem opinião sobre um atleta ou sobre o modo de jogar da equipe. Em relação à torcida, a gente compreende, pois o torcedor é passional. O que incomoda é quando a imprensa especializada acaba fazendo críticas irônicas, debochadas e desrespeitosas em relação ao jogador, colocando apelidos e invadindo a vida pessoal dos atletas.
Mentalidade: Você considera que as redes sociais atrapalham o desempenho dos atletas?
Leandro Borges: Eu prefiro acreditar que não. Eu acho que todo mundo tem o seu momento de lazer, e que o jogador pode estar ali curtindo a família, postando suas fotos ou o que quer que seja. Claro, não se pode perder o foco. Claro, tem que ter limite. Se você quiser viver mais nas redes sociais do que no futebol, daí não, né.
Mentalidade: Você acha que os atletas se preparam para ligas estrangeiras?
Leandro Borges: Eu acho que hoje em dia os atletas se preparam sim. O futebol se tornou global. Você tem acesso a todas as ligas, e cada liga tem suas características. O atleta vai se preparar nos treinamentos, procurar aprender um pouco do idioma e compreender as características do futebol e do clube para o qual está pretendendo ir.
Mentalidade: E quando ocorre uma negociação do seu passe?
Leandro Borges: Se for uma negociação interessante, com um grande clube, é bom para a carreira. Já, quando você está em um grande clube e aparece um clube menor, o pensamento muda e surge a preocupação de dar um passo para trás. Mas, claro, às vezes é necessário dar um passo para trás para dar dois para frente depois.
Mentalidade: E a adaptação em um novo clube?
Leandro Borges: É complicado, principalmente quando você sai de um grande clube para atuar em um clube menor. A adaptação é bem complicada porque você não tem mais a estrutura de antes. É uma nova realidade e é complicado se adaptar. Quando se troca para um clube do mesmo porte, a adaptação é mais tranquila. No futebol, geralmente, você conhece alguém com quem já jogou, e você é bem recebido. Mas a maior dificuldade é quando você vai para um clube menor, e isso, sem dúvida, impacta no desempenho. Essa é a maior preocupação para o atleta: a estrutura do clube.
Mentalidade: E as derrotas? Como funciona essa parte na mente dos atletas?
Leandro Borges: Quem resolve se tornar um profissional do esporte não pode aceitar a derrota. Tem que compreender a derrota, saber os motivos, mas não pode aceitar. A derrota é sempre difícil para um atleta. Quando se está em um momento de dificuldade, além de refletir sozinho sobre o problema, é fundamental procurar ajuda entre os companheiros, pois todos precisam se ajudar para sair dessa situação. Você não pode deixar que a derrota faça parte do seu dia a dia. Você tem que estar acostumado a vencer. A derrota faz parte? Sim. Mas ela precisa ser a exceção. O jogador precisa estar acostumado a vencer. Eventualmente, ter resultados negativos faz parte, mas o jogador precisa estar acostumado a vencer. Mesmo com péssimas atuações, é possível vencer, e muitas vezes se perde jogando bem. Jogamos bem, mas perdemos, isso não é bom. Jogamos mal e mesmo assim vencemos, isso é bom. Melhorar ganhando é muito melhor do que melhorar perdendo. A vitória precisa fazer parte do seu dia a dia. E você não pode aceitar a derrota, tem que ser competitivo a cada partida, e você tem que colocar na sua mentalidade que você é um vitorioso e que você é um ganhador. Você não pode aceitar a derrota.
Mentalidade: Você vivenciou algum problema emocional com alguma equipe?
Leandro Borges: Acho que todo mundo já passou por isso. As equipes geralmente têm um momento de transição até encontrar o caminho das vitórias. Muitas vezes você começa o campeonato perdendo uma ou duas partidas e não encontra o caminho da vitória. Por isso, não se pode aceitar a derrota para não entrar nesse ciclo vicioso da derrota. Depois de uma ou duas derrotas você já começa a ter medo de dar um passe, fica com receio de fazer uma jogada mais complicada, já não domina a bola direita… Quando você está ganhando é diferente, você já chuta do meio do campo, quer fazer gol olímpico, dar uma bicicleta, isso porque você está confiante, e as coisas acabam dando certo. Você acaba fazendo coisas que nem sabia que conseguia fazer. É muito complicado quando a equipe entra nessa espiral de derrota, e é só com muito trabalho emocional para sair dessa situação.
Mentalidade: Você acredita que as categorias de base fazem um bom trabalho no Brasil? O que você mudaria?
Leandro Borges: Aqui é um problema muito sério. Porque eu vejo as categorias de base com uma boa estrutura, mas eu acho que falta a participação de ex-atletas. Atletas profissionais, que jogaram, são fundamentais para forjar o atleta para o futuro. É na base que você vai preparar o jovem para os desafios da vida profissional. Ali você trabalha o emocional, a técnica e tem muitas situações que só quem jogou pode transmitir para um jovem. Como você se sente na hora de bater um pênalti aos 45 minutos quando o time está perdendo? Isso é muito complicado. Como você ensina a cabecear uma bola quando está cara a cara com o goleiro? Tenta driblar, bater por cima, por baixo, dar um giro em cima do zagueiro, cabecear por trás… São questões técnicas e táticas que só quem jogou e sentiu a emoção e a pressão do que é estar em campo sabe. Eu acredito que somente um jogador consegue transmitir esses ensinamentos para os jovens.
Tem que aprender os fundamentos do futebol, a chutar com as duas pernas, dar um passe, inverter o jogo, tirar um coelho da cartola, como a gente diz no futebol, e isso, com um atleta profissional, que jogou e conhece a vida dentro de campo, fica muito mais fácil. Além disso, um jogador sabe quando um jogador está bem ou não em uma equipe. Para mim, é fundamental a participação de ex-atletas na formação dos jovens jogadores.
Mentalidade: Que tipo de orientação você acredita que está faltando para jovens jogadores?
Leandro Borges: Hoje, para o jovem atleta, eu acredito que o que mais falte é a informação de que ele está em processo de profissionalização ainda. Ele ainda não é um atleta profissional, mas está em um processo. Além disso, nem se sabe se ele será um profissional. Outra coisa é o nível de ambição dentro do esporte. Que tipo de atleta ele quer ser? Um atleta de ponta, de grandes clubes ou apenas ser um jogador comum? Mais uma vez, falta a conexão, falta o ex-atleta, para dar o depoimento, para explicar como a coisa funciona de verdade.
No futebol, você tem que matar um leão por dia, e as coisas mudam muito rápido. Em um dia você é ídolo, no outro dia você está desempregado e sem um clube para treinar. O jogador precisa se preparar diariamente. É preciso desenvolver essa consciência de que eles ainda não conquistaram nada, que ainda são jogadores da base e que não conquistaram nada pelo futebol profissional e nem têm um papel importante dentro do cenário profissional do futebol.
Acredito que é preciso deixar claro para os jovens que o futebol exige muita preparação e dedicação diária. Exige um comportamento específico. Eles precisam abdicar de muitas coisas, é uma vida de restrição. É uma vida que pode trazer muita lucratividade, mas ao mesmo tempo pode levar a deixar muita coisa de lado. Outro ponto é a questão da educação, além da familiar, aquela educação técnica para as coisas da vida e que prepara a pessoa para as situações comuns do dia a dia e da vida de qualquer pessoa.

Que ótima entrevista, muito importante para os novos jogadores que aí estão e que tem que lidar com tantas demandas que vão muito além do “jogar bem”.
Obrigado, Deise.
Nossa proposta é justamente essa. Trazer a experiência para jovens em formação, seja qual for a área em que estejam atuando.